Eu não uso máscara. Sou desembargador e falo francês.

Há quantas décadas o Brasil é o país da carteirada, seguida da frase: “você sabe com quem está falando?”. É possível que desde o império português, quando Dom Pedro I assumiu a colônia tropical do hemisfério sul. Um lugar estranho com muito pau-brasil, animais selvagens e índios sem religião. Os superiores nobres do hemisfério norte olharam àquela gente desnuda, sem cultura e sem riqueza material de cima para baixo. “Somos superiores. Precisamos exercer essa superioridade. Faremos dessa terra sem lei um lugar civilizado, onde os homens brancos com ensino superior e educação refinada exerçam a superioridade sobre os nativos de pele escura”.

Bienvenue au Brésil

O desembargador do qual não citaremos o nome, porque o Brasil já sabe de quem se trata, é herdeiro desse tipo de mentalidade anacrônica de um império morto que sobrevive nos tolos. Talvez o homem da carteirada, um verme sem importância, seja punido de forma exemplar: aposentadoria compulsória com vencimentos integrais pagos religiosamente, mês a mês. Se isso incomoda? Muito. Punição de juiz no Brasil é piada sem graça.

Resta o consolo do desgaste da imagem do fulano em todos canais de televisão do país e nas redes sociais. Graças à tecnologia do smatphone, da internet, do mundo moderno, da democracia e da imprensa livre, a sociedade assistiu ao legítimo representante que se julga acima dos demais mortais por ostentar um título na magistratura.

O poder judiciário é um dos três poderes da república que insiste em manter essa linha de pensamento arrogante, seguido do poder legislativo. Talvez porque os magistrados tenham o poder de julgar a patuleia, não se enxergando passível a julgamentos. Felizmente, o país não é o mesmo do império. Aos trancos e barrancos vem mudando com a ajuda da imprensa e da tecnologia.

O Conselho Nacional de Justiça – CNJ deu bom exemplo ao levar o caso para a esfera federal, tirando do âmbito da corregedoria estadual a investigação da ofensa aos guardas municipais, da Prefeitura de Santos, Cícero Hilário Roza Neto e Roberto Guilhermino. A conferir se a punição ao verme de toga será mais do mesmo ou se o CNJ vai avançar no quesito punição.

Resta a nós, mortais brasileiros, não magistrados, dessa terra de índios, árvores e pássaros comemorar a homenagem muito bem sacada pelo prefeito de Santos, Paulo Alexandre Barbosa, com a presença de familiares dos policiais. Foi uma resposta à altura ao verme e uma sinalização de mudança para a sociedade.

Um detalhe chama atenção nessa homenagem: a presença do secretário Sérgio Del Bel, o tal que o desembargador ligou para mostrar que tem acesso ao mundo superior. O comportamento das autoridades municipais foi exemplar. É torcer que a pedagogia do erro sirva de lição para evitar que casos como esse se repitam. Au revoir

ARNAUD MATTOSO não é desembargador, mas acredita na justiça brasileira.

@arnaudmattoso #somostodoscicero

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